O Jabuti é a designação dada para identificar um réptil semelhante à tartaruga e que possui uma característica marcante: a “carapaça” alta e resistente. Ela serve como um escudo para o animal se “esconder” do ataque de possíveis predadores.
No âmbito legislativo, com certa frequência, temos o aparecimento de “jabutis”, aqueles temas impopulares que o legislativo precisa “esconder” em assuntos de fundo de outros projetos aparentemente mais importantes. Tempos crise e calamidade pública ao qual vivenciamos em função do coronavírus são momentos essenciais para o surgimento desses “répteis”, já que a população em si está com sua atenção voltada para outro lugar.
É também nesses momentos mais difíceis é que aflora nos parlamentares o sentimento “Robin Hood”. (Famoso herói mítico inglês que roubava da nobreza e repassava aos mais pobres) Temas como taxação das grandes fortunas e dividendos tomam grandes proporções na mídia como forma ilusória de salvação do País.
Nesse contexto o Projeto de Lei nº 766, de 2020, que institui o Sistema Solidário de Proteção à Renda. O sistema tem como objetivo complementar a renda dos beneficiários do bolsa família, bem como os demais brasileiros registrados no Cadastro Único de Programas Sociais.
O citado projeto tem como fonte de custeio a revogação da isenção do imposto de renda sobre na distribuição de dividendos e lucros de pessoas jurídicas para pessoas físicas nos termos do art. 10 da Lei nº 9.249, de 1995. Este tema é bastante sensível aonde sua modificação já vem sendo discutida há algum tempo porem sem muitos avanços.
O que nos causa inquietações é a forma de como o legislativo pretende resolver um problema delicado aproveitando uma calamidade na saúde como pano de fundo. Mais do que isso é ver que o texto do projeto é baseado em regras fora dos regramentos constitucionais.
O Projeto de Lei nº 766, de 2020, autoriza o poder executivo a revogar, por ato, a isenção de distribuição de dividendos e lucros de pessoas jurídicas para pessoas físicas. Se o projeto é de uma Lei em sentido estrito, porque o mesmo já não revoga diretamente o art. 10 da Lei nº 9.249/95? Porque a necessidade de transferir para o Executivo uma decisão que é de competência do legislativo? Por óbvio há questões políticas envoltas no assunto que não nos cabe comentar neste momento.
O que nós sabemos é que a Constituição estabelece o funcionamento harmônico entre os três poderes, (Executivo, Legislativo e Judiciário) cada um exercendo a sua respectiva competência. Logo entendemos que o § 3º do artigo 2° do Projeto de Lei nº 766, de 2020, vai à contramão do funcionamento do nosso Estado democrático de direito, pois transfere função ao Executivo que é de atribuição do Legislativo.
Já o § 4º do artigo 2° do Projeto de Lei nº 766, de 2020, estabelece ainda a possibilidade de a Receita Federal instituir alíquota progressiva na cobrança do IR sobre os dividendos. Mais um ponto que fere claramente o processo legislativo e o sistema tributário, já que o CTN prevê que apenas mediante a Lei pode ser criada ou majorada alíquotas de tributos, cabendo a Receita Federal em ato próprio, somente, e tão somente, reproduzir aquilo que já está transcrito em Lei.
Com todo respeito ao Senador que elaborou o projeto, ele claramente não tem o objetivo de ajudar a população e sim aumentar a carga tributária em um momento que precisamos reduzi-la. Se as pessoas jurídicas estão pleiteando atualmente pelo menos a suspensão do pagamento dos tributos atuais, pois se encontram sem caixa, como vão pagar mais essa exação?
Entendemos que a discussão da tributação dos dividendos é necessária, mas ela deve percorrer um debate estritamente técnico, pois envolve vários atributos e conceitos que precisam ser analisados pela ótica justiça tributária como também da separação de patrimônio entre pessoa jurídica e física.
Demandar tempo de parlamentares para a discussão de projetos como esse – nutrido de inconstitucionalidades e com viés que vislumbra possíveis ganhos políticos futuros – é fazer um desserviço população.
Esperamos que esse artigo tenha ajudado você. Conte sempre conosco!
Fonte: Tributário